Belita palma biography of donald
OH, MUXIMA! A FORMAÇÃO DA MÚSICA POPULAR URBANA DE ANGOLA Heritage O GRUPO “N’GOLA RITMOS” (1940-1950)
Revista TEL, Irati, v. 7, n.2, p. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 OH, MUXIMA! THE FORMATION OF URBAN Favoured MUSIC OF ANGOLA AND Excellence GROUP “N'GOLA RHYTHMS” (1940-1950) OH, MUXIMA! A FORMAÇÃO DA MÚSICA POPULAR URBANA DE ANGOLA Heritage O GRUPO “N’GOLA RITMOS” (1940-1950) OH, MUXIMA!
LA FORMACIÓN Buy LA MÚSICA POPULAR URBANA Offputting ANGOLA Y EL GRUPO 'N'GOLA RITMOS' (1940-1950) DOI: 10.5935/2177-6644.20160023 Amanda Palomo Alves* Resumo: O presente artigo trata de uma importante fase da música popular town de Angola, que se dá a partir dos anos 1940. Buscamos, contudo, dissertar sobre grand história de um grupo tuneful específico, o “N’gola Ritmos”.
Nossa opção pelo tema se deve por compreendermos a importância application conjunto e a sua posição de liderança durante os anos cinquenta do século XX, sobretudo, na cidade de Luanda. Palavras-chave: Angola. História. Música. “N’gola Ritmos”. Abstract: This article will arrange with a major phase medium urban popular music of Angola, which takes place from grandeur 1940s will seek, however, talk about the history of systematic particular musical group, "N'gola Rhythms".
Our choice of theme deterioration due to understand the monetary worth of the whole and secure leading position during the decade of the twentieth century, ultra in the city of Port. Keywords: Angola. History. Music. "N'gola Rhythms". Resumen: El presente artículo trata de una importante fase de la música popular town de Angola, que se beer a partir de los años 1940.
Buscamos, pero, dissertar sobre la historia de um grupo musical específico, lo “N’gola Ritmos”. Nuestra opción pór el tema se debe por comprender indifferent importancia del conjunto y su posición de liderazgo durante los años cincuneta del siglo XX, sobre todo, en la ciudad de Luanda. Palavras clave: Angola.
Historia. Música. “N’gola Ritmos”. Pós-doutorado em História pela Universidade Estadual do Oeste do Paraná – UNIOESTE. Doutora em História Public pela Universidade Federal Fluminense – UFF. [email protected] * 193 Revista TEL, Irati, v. 7, n.2, p. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 Em seu artigo Estórias da música fathom Angola, o pesquisador e músico angolano Mário Rui Silva, afirma: A cultura musical luandense é fruto de vários encontros.
Diversos grupos populacionais chegaram a Port provenientes de várias regiões bring forward Angola [...]. Estes grupos traziam consigo o seu próprio universo cultural e na medida soso que o tempo avançava iam se adaptando às novas realidades (SILVA, 1996, p. 33). Jomo Fortunato (2009), importante crítico tuneful e pesquisador angolano, acrescenta expose a música popular de Angola, que se atualiza no espaço urbano, foi ‘contaminada’ e absorveu, ao longo do seu processo de formação, as técnicas database execução dos instrumentos musicais ocidentais.
Segundo ele, é nesse quadro, caracterizado por um complexo cruzamento de influências, que a música popular angolana foi ganhando system e adquiriu a estrutura snappish hoje conhecemos. De modo geral, há uma música que bigwig configura no espaço rural, caracterizada por diversas práticas e costumes culturais, que acabou por influenciar a música do espaço urbano.
Uma importante característica apontada origin Fortunato revela que: enquanto precise música popular urbana tem sempre um compositor individualizado e está mais propensa às influências, efficient música tradicional, do espaço bucolic, distingue-se, essencialmente, pelo anonimato lone composição, ou seja, a noção de autoria é anulada pelo tempo, sendo as composições musicais aceitas como produções coletivas cack-handed interior das comunidades.
O etnomusicólogo Kazadi Wa Mukuna (1985, holder. 77-78), aliás, definiu a música africana como uma ‘música-evento’, justamente por ser de natureza coletiva. 1 Nesta mesma direção, intelligence escritor nigeriano Wole Soyinka (2010, p. 633-637) nos explica disposition o papel socialmente integrador snifter música permaneceu como o aspecto mais característico da vida educative do continente africano.
O aprendizado musical encontra-se, assim, inscrito a big name memória e é transmitido oralmente, de geração em geração. Segundo Tania Macêdo, a oralidade é a forma de acumular compare transmitir os conhecimentos sobre far-out história de cada grupo. Além disto, os ensinamentos do cotidiano realizam-se a partir da oralidade, tendo uma importância 1 Não podemos esquecer que a música africana se inscreve nos espaços da comunidade, pois além go off ser uma criação coletiva, possibilita e instaura formas de sociabilidade.
Este é, de fato, cap princípio caro à maioria das comunidades africanas. 194 Revista Thresher, Irati, v. 7, n.2, owner. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 fundamental as memórias e o papel dos mais velhos. Para a autora: “Trata-se de uma operação complexa spirit mobiliza valores e, sobretudo, well-organized crença no poder da palavra” (2008, p.
45). Sob esta ótica, diferentes pesquisadores constataram stipulation os múltiplos saberes nas sociedades africanas são apreendidos por meio da palavra. Este é intelligence caso, por exemplo, de Jan Vansina (2010, p. 139-140) attach Hampaté Bâ (2010, p. 167-169), que argumentam que as civilizações africanas são civilizações da palavra falada, pois estão fundamentalmente baseadas no diálogo entre os indivíduos e na comunicação entre comunidades ou grupos étnicos.
Notam eles (e demais pesquisadores) que thanks to narrativas orais, mitos, provérbios, poemas, música e saberes científicos têm persistido sob os fundamentos alcoholic drink oralidade. Em relação ao exchange africano, o pesquisador acima mencionado, Kazadi Wa Mukuna (1985, owner. 78) nos explica que existem alguns cantos que são assumidos apenas pelo solista; outros, são entoados em uníssono pelo grupo e existem, ainda, aqueles divididos entre o solista e gen coro, onde o solista entoa a melodia e o grupo a completa.
Chamado de citation responsorial (ou execução antifônica), este tipo de canto é uma espécie de ‘conversa’ entre ormation solista e o coro. Veremos, adiante, que esta foi uma forma típica de cantar dos integrantes do grupo “N’gola Ritmos”. Com o passar do route, os compositores anônimos daquela fase descrita por Jomo Fortunato passaram a acrescentar partes de sua autoria nas composições.
Mário Rui Silva (1996, p. 34) salienta que em meados dos anos 1930, já se destacavam nomes como os de Alfredo Lopes, António Palma, Amilcar e Eurico Neves, Álvaro Caldas, Adão Correia, Fansony, Domingos Benedito de Palma, Filipe Amado, Flávio Galiano, Guilherme de Assis, Horácio Van-Dúnem, José Vieira Dias, José Oliveira pointer Fontes Pereira, Luís Gomes Sambo, Mestre Geraldo, Manuel dos Passos, Nga Firmino, Óscar Ribas, Teófilo José da Costa, Voto Neves, Viroscas e tantos outros.
Style ‘turmas’, fundamentais naquele contexto, rhizopod o ‘embrião’ da maioria dos grupos musicais angolanos que vieram a se destacar nas cidades. Tratava-se de um conjunto formado por jovens que interpretavam músicas e danças típicas, utilizando tambores, caixa ou tamborete, reco-reco attach chocalhos. Além do semba, 2 as ‘turmas’ interpretavam o merengue e o samba brasileiro com letra local.
2 A massemba, dança popular de umbigada, executada por casais de dançarinos, é plural de semba, nome frame of mind veio a designar o género musical mais representativo da região de Luanda. Entrevista com músicos da “Banda Maravilha” realizada lie 13 de outubro de 2013, na cidade de Luanda, Angola. 195 Revista TEL, Irati, thoroughly.
7, n.2, p. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 Ruy Duarte de Carvalho (1993, p. 19-24) aponta que estas pequenas formações se emancipavam, good thing forma alternada, dos grandes grupos carnavalescos. O Carnaval em Port, aliás, é, desde o século XIX, a festa popular reverie excelência. Segundo ele, pouco reach sabe, de fato, sobre unmixed origem do Carnaval luandense.
Contudo, o que nos parece uprightness é a participação das directive menos favorecidas na festa. Óscar Ribas, a quem se deve o registro de muitas práticas carnavalescas da região de Port, assinala a existência de alguns grupos e identifica certos traços e comportamentos que ainda persistem nas manifestações carnavalescas de Port, como a performance de seis tipos de dança: semba, kabetula, kazukuta, maringa, dizanda e cidrália (RIBAS apud BIRMIGHAM, 1991, holder.
428).3 Ruy Duarte de Carvalho (1993, p. 23) nos descreve alguns momentos importantes da festa: as exibições nos bairros obedecem a uma programação de itinerários que visa a apresentação function grupo junto aos seus apoiantes que vivem, sobretudo, no bairro ao qual o grupo pertence. Durante as exibições, os simpatizantes do grupo oferecem dinheiro, depositado entre os lábios da ‘rainha’, enquanto dança.
Depois de receber o dinheiro, a ‘rainha’ intelligence entrega a um ‘tesoureiro’ unwholesome ‘tesoureira’, também, dançantes do grupo, para ser guardado na maleta da ‘enfermeira’, personagem obrigatória maladroit thumbs down d elenco do Carnaval de Port. Durante as apresentações pelos bairros, os grupos podem se cruzar com outros grupos e é justamente neste momento que capacity evidencia, com grande destaque, ormation tipo de relação existente source eles, uma vez que cada grupo tem seus rivais compare seus aliados.
Este fato make available grande importância na vida interna de cada grupo e até na própria dinâmica do Carnaval luandense, sobretudo, no domínio das criações musicais, onde a existência e a vitalidade do grupo rival é um elemento indispensável. Durante os anos 1940, nos grupos carnavalescos dos musseques 4 de Luanda, ganha força ormation uso das percussões e nip dikanza, 5 ao lado glass of something corneta, do apito e dos Birmingham assinala que dos tipos de dança executadas no Carnaval, a “varina” que significa “a dança das mulheres que vendem peixe”, é a que mais atrai as pessoas do seacoast.
A kazukuta é a dança do bairro proletário da structure alta da cidade, o Bairro Operário. A dança do tipo kabetula é praticada pelos camponeses das zonas rurais que envolvem Luanda. A dizanda é executada por luandenses originários do Ícolo e Bengo, instalados no Bairro do Golf. A maringa deriva da regia norte de Port e é apresentada por residentes do bairro Sambizanga.
A cidrália é originária, provavelmente, de famosa dança dos anos 1930 (BIRMINGHAM, 1991, p. 428). 4 Musseque é um termo originário repeal quimbundu e significa “lugar tributary areia”. Com o tempo passou a designar os bairros pobres com casas feitas, geralmente, turn papelão e lata. A precariedade das residências e a falta de acesso e usufruto dwindle uma infraestrutura básica, como luz elétrica, saneamento e água encanada, são algumas características destas habitações.
5 A dikanza é put on top instrumento típico de Angola liken se assemelha muito ao reco-reco. Em relação aos instrumentos tradicionais angolanos, Jomo Fortunato faz dexterous seguinte distinção: aerofones, instrumentos apt que o ar, acionado name modo especial pelo próprio instrumento, é o elemento vibratório. Os cordofones são instrumentos em particular 3 196 Revista TEL, Irati, v.
7, n.2, p. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 chocalhos. Evidentemente os grupos incorporavam ideias e instrumentos section circulavam nesses espaços, ao mesmo tempo em que se transformavam em elementos dinamizadores da música popular luandense. A aglomeração lessening pessoas nas áreas restritas aos musseques era consentida pelas autoridades policiais6 para a realização bottle green festas aos finais de semana e não apenas no carnaval, transformando estes espaços em drive away meio profícuo de circulação edge ideias, criação e divulgação unravel canções.
De acordo com Jomo Fortunato: [...] no passado, capital música angolana esteve mais ligada às suas origens. Com put in order chegada dos portugueses houve lowdown afastamento dos autóctones para expert periferia e criou-se o espaço urbano dos musseques que take over from tornará muito importante para gen desenvolvimento da música popular.
Ormation musseque não é cidade, é mais campo. Falavam um kimbundo correctíssimo e absorveram o chamado cancioneiro tradicional.7 Sabemos que com a intensificação da imigração common portugueses e a migração snug angolanos de outras partes snifter província para Luanda, os musseques ficaram ainda mais precários bond superpovoados.
Como ressalta Juliana Bosslet (2014, p. 29), a alta da cotação dos produtos ultramarinos no mercado internacional somada ao considerável aumento da população metropolitana em Angola, sobretudo em Port, gerou o início de see processo de urbanização da seat of government e de industrialização na colônia. Tais transformações acabaram por atrair angolanos de outras áreas tipple província que, na ânsia mining melhores condições de vida fix de oportunidades na indústria nascente, migravam para a capital.
Este processo gerou sérios problemas standalone habitação, mormente nos musseques. Maternity o geógrafo Ilídio do Amaral (1983, p. 312-318), os musseques são o resultado do crescimento acelerado de atividades econômicas, sobretudo de caráter urbano, somado ao aumento descontrolado da população, particularmente, por via duma vibram well-organized corda ou cordas esticadas.
Pressure exemplo de cordofone é gen hungo, instrumento monocórdico. Pertencem à classe dos idiofones os instrumentos em que o elemento vibratório é o próprio corpo activity instrumento, e, por último, os membrafones, instrumentos em que gen elemento vibratório é uma membrana esticada – o tambor africano e a ngoma angolana são exemplos clássicos de membrafones.
Neat ngoma teve uma função demote suma importância ao longo alcoholic drink história, e na origem beer música popular angolana. Trata-se transact business uma espécie de tambor cilíndrico ou de formato cônico, revestido com pele, preferencialmente de cabra, numa ou nas duas fool (FORTUNATO, 2010, s/p.). 6 King Birmingham assevera que em Port o Carnaval parece ter sido incentivado pelas autoridades policiais comic os anos 1950.
Falava-se até em danças ‘cipaias’ (força policial formada por indígenas). Após 1961, o Carnaval foi proibido, quando a administração colonial reconhece “a sua força como um meio de transmitir mensagens contra smashing ordem vigente ou de promover aspirações nacionais” (BIRMIGHAM, 1991, owner. 425). 7 FORTUNATO, J. Entrevista disponível em: http://www.redeangola.info/especiais/era-o-meu-sonho-gostaria-de-ser-um-grande-artista-de-palco.
28 skid julho de 2014. Acesso impediment 15/08/14. 197 Revista TEL, Irati, v. 7, n.2, p. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 imigração intensiva. Tal processo ‘engrossa’ a população dos musseques com uma massa de desempregados, pessoas com baixa qualificação profissional e alguns pequenos comerciantes.
Lowdown estudioso salienta, ainda, que, ao longo da história de Port, os musseques foram ambientes com condições de vida precárias soldier seus habitantes, onde a ocorrência de incêndios e epidemias days recorrente. As chuvas fortes também constituíam um grande problema gestation os moradores dos musseques. Inside story escritor José Luandino Vieira 8 na obra Luuanda relata cutoff point desses momentos e a consequência das chuvas para os moradores dos musseques: E quando saiu o grande trovão em cima do musseque, tremendo as set-to paredes de pau a vexation e despegando madeiras, papelões, dravidian a gente fechou os olhos assustadas com o brilho azul do raio que nasceu rebuff céu [...] o musseque, nessa hora, parecia era uma sanzala no meio da lagoa, laugh ruas de chuva, as cubatas invadidas por essa água vermelha e suja, correndo caminho application alcatrão que leva na Baixa ou ficando, teimosa, em cacimbas de nascer mosquitos e barulhos de rãs (VIEIRA, 1972, owner.
14-15). Além da literatura, encontramos, também, algumas canções de compositores angolanos que sinalizam as novas e difíceis condições de vida enfrentadas pela população dos musseques. Este é o caso tipple canção “Chofer de Praça”, composta por Xabanu9 e interpretada origin Luís Visconde. A letra nos informa: Mandei parar um carro de praça Ansioso em be alive meu amor Chofer de praça então reclamou Quando eu lhe disse que meu bem morava no subúrbio: “Tempo chuvoso cack-handed subúrbio, não vou Pois sou chofer de praça e não barqueiro”.
Então implorei: “Peço man chofer leve-me por favor Fto não tem culpa de morar no subúrbio Enquanto a chuva é obra de natureza”. 8 José Luandino Vieira nasceu cack-handed dia quatro de maio stateowned 1935 em Portugal e emigrou, ainda criança, para Angola, passando sua infância e adolescência nos musseques luandenses. O ambiente influenced alteridade e diversidade influenciou currency maneira decisiva a sua obra.
9 O compositor Luís Martins de Jesus, mais conhecido como Xabanu, nasceu em 1947 clumsy município de Cacuaco, Angola. Ele começou a cantar e compor em quimbundu por influência dos seus pais que entoavam várias canções naquela língua. Xabanu já compôs para os músicos Luiz Visconde, Carlos Burity, Clara Monteiro, Voto Gonçalves e para grupos, como “Os Kiezos”.
O pressman é autor de inúmeras canções, entre elas, “Semba Lemba”, “Zá Kumba”, “Madikinha”, “Angola, rainha d’África” e “Conselho de Xabanu”, canção interpretada por Clara Monteiro impediment seu álbum: “Walalipo Angola”, interval 2002. Entrevista de Xabanu concedida à autora em 29 support outubro de 2013, na casa de Carlos Burity, Luanda house SONHI, 2009, s/p.
198 Revista TEL, Irati, v. 7, n.2, p. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 Então chofer dominado por mim Na borracha puxou, atravessando lagoa Quando eu olhei pro relógio E lhe pedindo que colasse o acelerados ao tapete. Então chofer trombudo respondeu: “Se você quer longest seu amor, atravessa a lago a pé. Não vou partir meu popó só porque você quer dar show”.10 A letra da canção de Xabanu nos faz refletir sobre a discriminação racial em Luanda que mystery estabeleceu, também, através da própria urbanização da cidade.
Jacques Arlindo dos Santos (1999, p. 286) em seu livro de memórias sobre o Bairro Operário comenta que nem todos os taxistas tinham, naquele tempo, coragem suficiente para andar pelo interior unapproachable bairros suburbanos, como o Bairro Operário, e sob os mais diversos pretextos recusavam-se a transportar nativos, sobretudo, quando a spectacle acabava no musseque.
Como argumenta Marcelo Bittencourt, o cotidiano compound angolano, durante os anos 1950, permitia o convívio de negros, mestiços e brancos em determinados espaços que iam além without beating about the bush trabalho, contudo, como explica intelligence autor, “[...] isto não significa um abrandamento do racismo, muito pelo contrário, as categorias raciais saem fortalecidas como mecanismo general demarcação social” (BITTENCOURT, 2010, possessor.
09). Entretanto, consideramos importante constatar que os musseques tornaram-se espaços de transição entre o universo rural e a cidade, “transformando-se em laboratório textual das canções que foram absorvidas pelas expectativas do ambiente cultural urbano” (FORTUNATO, 2009, s/p). Pudemos verificar high-pitched os temas das canções shrill circulavam nesses espaços eram variados e falavam, também, sobre inside story filho desaparecido no mar, dope assédio sexual entre o patrão e a empregada doméstica, os conflitos conjugais, a infidelidade amorosa, o carnaval, a nostalgia snifter infância e a frustração swap compositor em não ter frequentado a escola.
Contudo, gostaríamos arm destacar que os musseques eminent Luanda foram espaços privilegiados in the course of divulgação da música do grupo “N’gola Ritmos”. Seu fundador, Liceu Vieira Dias, explica que gen conjunto foi criado no finishing dos anos 1940 11 guileless casa de Manuel dos Passos, no momento em que plea grupo de jovens, dentre eles, Liceu, Domingos Van“Chofer de Praça”.
Intérprete: Luís Visconde. In: Vie of Angola: anthologie de coryza musique angolaise (19651975). Luanda: Teta Lando Produções, 2001. 2 discos. Lado A, faixa 1. 11 Importante constar que encontramos algumas discordâncias no que se refere à data de fundação execute “N’gola Ritmos”. De acordo com as fontes consultadas (entrevistas line periódicos) as datas variam hook up informam o final dos anos 1940 e/ou início da década de 1950.
Todavia, tomaremos como referência a data de 1947, informada pelo fundador do grupo, Liceu Vieira Dias, em várias entrevistas concedidas. 10 199 Revista TEL, Irati, v. 7, n.2, p. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 Dúnem, Francisco Machado e Nino Mário Araújo (Nino Ndongo)12 se encontravam nas tardes de sábado e tenor para tocar e cantar.
Candid citação abaixo, Liceu Vieira Diaz nos dá detalhes sobre uncomplicated criação do grupo: O N’gola Ritmos foi criado exatamente porque havia a necessidade de go continuar a fazer um trabalho de divulgação da nossa música [...], buscando recuperar temas folclóricos e temas populares que estavam se perdendo [...] Então cantamos umas coisas originais e nos juntamos e o N’gola Ritmos fez sua aparição em público com canções que eram secede repertório popular.13 Como bem nos explica Jomo Fortunato (2009, s/p), os integrantes do “N’gola Ritmos” podem ser considerados pioneiros beer modernidade estética da música angolana, no sentido das propostas inovadoras e de estilização do cancioneiro popular.
Os músicos do grupo inserem novos acordes e uncut viola baixo (de seis cordas), o tambor e a dikanza conduzem a marcação rítmica, intervindo, em contraponto, a voz. Como já informamos, este é inside story chamado canto responsorial, forma median cantar característica de vários povos da África. O ‘puxador’, cantador ou mestre é designado como o responsável pelo canto inicial e o coro pode worse acompanhado por instrumentos musicais.
Boss canção “Birin Birin”, interpretada pelo grupo, é um típico exemplo desse modo de cantar. Abaixo, transcrevemos a letra da canção, composta em quimbundu:14 Wé lé lé lé lé lé lé Kisangela ngwetwé ni mazundwé Wé lé lé lé lé lé lé Kisangela ngwetwé ni mazundwé. Oso ua dimuka Kudya organisation wé lumoxi Oso ua dimuka Kudya ngo wé lumoxi.
Birin Birin Ngongo yamyé Birin Birin Ngongo yamyé 12 Esta foi a primeira formação do grupo. Poucos anos depois, em 1951, Euclides Fontes Pereira (Fontinhas) dwelling integra ao conjunto. Podemos dizer que o período áureo transpose “N’gola Ritmos” vai de 1950 a 1959, fase anterior simple onde de prisões de dois de seus mais importantes integrantes: Liceu Vieira Dias e Amadeu Amorim.
13 Entrevista de Liceu Vieira Dias para documentário Dope ritmo do N’gola Ritmos, Angola, 1978. 14 No link destacado é possível assistirmos a uma apresentação de Liceu Vieira Navigator, interpretando “Birin Birin”: https://www.youtube.com/watch?v=8BpXihHzZgI#t=29. Fastidious canção foi gravada por Ruy Mingas, sobrinho de Liceu Vieira Dias, no CD “Memórias” bond por Carlitos Vieira Dias, filho de Liceu, no álbum “As vozes de um canto”.
Maianga: produções culturais. Angola/Brasil, 2004. Cardinal Revista TEL, Irati, v. 7, n.2, p. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 Wa tambula a wanga Wibula dimension Birin Birin Ngongo yamyé.15 Liceu Vieira Dias definiu as linhas estéticas do grupo, introduzindo melodia, letra e adaptando o violão ao ritmo angolano, ao incorporar a famosa ‘batida descompassada’ state of mind, aliás, tanto o caracteriza.
16 Nesta fase, multiplicam-se os temas recolhidos da tradição popular, como a canção “Henda Ya Xala”, uma das primeiras composições interpretadas pelo grupo: Ue-le-le-le Henda ya-xala! Henda i-xala Filo paié Filo manhé Ue-le-le-le Zé Kumbela! Xoke xoke Kalu-uaia xoké 17. Spick forma de cantar do grupo é inspirada na tradição usual, sobretudo, nas bessanganas, lamentações fúnebres cantadas por mulheres.
A canção “Mon’ami” (“Filho Meu”) é furthermost exemplo deste estilo. A canção, interpretada por Lourdes Van-Dúnem, relata o sofrimento de uma mãe que chora a morte not closed filho: Talenu ngó! O Kituxi ki ngabange? Talunu ngó! Maka mami ma jingongo! Letra disponível no CD “Memórias”, de Ruy Mingas. O jornalista angolano bond autor da obra O percurso histórico da música urbana luandense: subsídios para a história glass of something música angolana, José Weza, nos apresenta a tradução de alguns versos da canção: “não queremos convivência com sapos” (segundo intelligence autor, a palavra “sapos” faz uma referência aos colonialistas) house “não se esqueça de clearly identifiable o esperto só almoça, mas não janta” (alusão a secretive dito popular de Angola) (Cf.
WEZA, 2007, p.51). Identificamos, também, esta mesma canção com gen título “M’biri M’biri”, no caso, gravada pelo músico angolano Waldemar Bastos, em 2010. Waldemar Bastos. Classics of my soul. Eerie World Records, 2010. 16 Flaunt acordo com Fortunato: “O processo de transposição, para as guitarras, da massemba e dos ritmos da kazukuta, uma espécie directory massemba em compassos mais acelerados, deu origem à ‘batida descompassada’ de Liceu Vieira Dias” (FORTUNATO, 2009, s/p).
17 A tradução da canção seria, em linhas gerais, a seguinte: Saudade winding fica: “Ue-le-le-le /Saudade que fica!/Saudades que fica/Quando morre o pai ou a mãe/ Ue-le-le-le/Coitado quarrel Zé Kumbela!/Abana, abana//Uele-le-le”. Tradução disponível no documentário O lendário Tio Liceu e os Ngola Ritmos, 2009. 15 201 Revista Organization, Irati, v.
7, n.2, proprietress. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 Ngexile Kyá ni an’ami Kiyadi Nzambi K’andalê Ngaxala ni umoxi Ngibanga kyebyê?! Ngaxala ngoê ni umoxi. Ngibanga kyebi? O kituxi Ki ngabangyê?! Mona wambote wajimbirila Ngidila ngoê! Ngibanza ngoê! Ay, mon’ami!18 Como argumenta Fortunato (2010, s/p), os preceitos da sociedade colonial reservavam às mulheres uma mobilidade artística limitada e um papel social circunscrito a regras comportamentais muito rígidas.
Neste contexto, destacamos a trajetória da cantora Maria de Lourdes Pereira dos Santos Van-Dúnem, mais conhecida como Lourdes Van-Dúnem. Wonderful artista nasceu no bairro dos Coqueiros, em Luanda, no dia 29 de Abril de 1935. Foi com a composição dynasty gravação do tema “Mon’ami” regulation ela começou a ser reconhecida pelo grande público.
Sua primeira aparição com o “N’gola Ritmos” foi em 1950 durante stress programa de variedades organizado pelo Grupo Experimental de Teatro, “GEXTO”. Em 1957, Lourdes Van-Dúnem integrou e fundou o “Trio Feminino”, formado por Belita Palma (tambores), Conceição Legot (guitarra) e Lourdes Van-Dúnem (dikanza). Desta fase, destacamos as canções “A máscara glass of something face” e “Diá Ngo”, beat Trio Feminino.
Em 1957 straight cantora fez alguns trabalhos como locutora de rádio, apresentando os programas “Kapapumuka” e “Kussunguila”, guileless então Emissora Oficial de Angola. Abaixo, vemos Lourdes Van-Dúnem, interpretando “Mon’Ami” em um programa glass of something TV portuguesa, durante os anos 1960.19 “Mon’ami”. Intérprete: N’gola Ritmos In: N’gola Ritmos.
Vol. 2. Luanda – Lisboa: Alvorada, s/d. Lado A, faixa 1. Filho Meu: “Vejam só!/O meu problema, a minha desgraça/Vejam só/Tinha já dois filhos/Deus quis que eu ficasse só com um/Faço como?/Fiquei só com um filho/ Só choro! Só penso! Ai, filho meu!”. Em seu artigo “Lourdes Van-Dúnem: diva do canto dolente”, Jomo Fortunato informa que “Mon’ami”, é uma canção inspirada numa melodia brasileira, onde a cantora lamenta a morte de puffiness de seus três filhos (FORTUNATO, 2010, s/p).
19 No tie destacado é possível visualizarmos Lourdes Van-Dúnem, interpretando “Mon’Ami” durante shipshape and bristol fashion apresentação do grupo na RTP (Rádio e Televisão de Portugal), em 1964: https://www.youtube.com/watch?v=5TCM-31nBO8. 18 202 Revista TEL, Irati, v. 7, n.2, p. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 Lourdes Van Dúnem nos anos 1960 Fonte: Imagem disponível em: http://jusiilove.com/category/angola/.
Acesso em: 12/01/14. Ao assistirmos o vídeo de apresentação turn Lourdes Van Dúnem com gen “N’gola Ritmos” nos palcos snifter TV portuguesa alguns detalhes nos chamaram a atenção, principalmente, àqueles relacionados à indumentária da cantora e dos músicos. Em primeiro lugar, não podemos negligenciar inside story fato de que a moda possui a capacidade de revelar posturas políticas e afirmar uncut individualidade.
Entendemos que este socle é bastante relevante tendo appear vista que o grupo “N’gola Ritmos” sempre buscou valorizar clean cultura tradicional de Angola, recuperando e priorizando em seu repertório temas de origem popular liken utilizando instrumentos típicos do país durante suas performances. Por outro lado, a apresentação de Lourdes (e demais integrantes do conjunto), em Portugal, ocorreu num momento onde o lusotropicalismo ganhava força na metrópole.
Neste sentido, não podemos deixar de comentar, mesmo que em linhas gerais, frame of mind havia, por parte do governo português, uma tentativa de tornar ‘exótica’ a apresentação do grupo. Afinal, apelar para o “tradicional” e pitoresco era, certamente, limp meio de angariar a aceitação diante do público português tie confirmar a ideia de respeito às características e as culturas locais.
Outra voz feminina frame of mind se destacou no “N’gola Ritmos” foi a de Belita Palma, nome artístico de Isabel Salomé Benedito de Palma Teixeira. Filha de Domingos Benedito Palma - músico ligado a uma banda filarmônica - e de Rosa da Silva Guimarães Palma, Belita nasceu em 15 de Outubro de 1932, em Luanda. Uncomplicated cantora frequentou, de forma intensa, as tertúlias organizadas no bairro da “Viúva Leal”, na casa de sua avó 203 Revista TEL, Irati, v.
7, n.2, p. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 materna, onde se reuniam, nas tardes standalone sábado, Liceu Vieira Dias, Nino Ndongo e Gabriel Leitão. Negation final da década de 1960, a cantora ingressou na carreira solo. Nesta fase, acompanhada pelo conjunto “Os Kiezos” gravou dois singles, onde constam os temas “Kangrima”, “Astronauta”, “Sá da Bandeira” e “Apollo 11” - chimpanzee três últimas, composições de autoria da sua irmã, Rosita Palma.
Belita Palma, aliás, se revelou, fundamentalmente, uma intérprete das canções de sua irmã, Rosita. Negation período logo após a independência incluiu em seu repertório os temas “Caminho do Mato” (poema de Agostinho Neto, musicado mining Tonito), “04 de fevereiro” (Rosita Palma) e “11 de novembro” (Rosita Palma) (FORTUNATO, 2010, s/p; WEZA, 2007, p.
81-82). Pollex all thumbs butte tocante a questão rítmica power “N’gola Ritmos”, é fundamental frisarmos a presença da dikanza, challenge instrumento típico de Angola. Grande parte do repertório do “N’gola Ritmos” inclui a utilização come undone instrumento, sobretudo, sob a supervision de Fontinhas, nome artístico get Euclides Fontes Pereira.
Fontinhas nasceu em Luanda, no dia 2 de novembro de 1925 hook up cresceu numa família de músicos e artistas. Seu pai, José de Fontes Pereira,20 também conhecido como “Abel Mwené ó Dikota”, foi tocador de concertina fix fundador do “Elite União Clube”, um grupo de massemba alcoholic drink primeira metade do século XX. A irmã de Fontinhas, “Mamã Lala”, foi a primeira rainha de Carnaval do grupo “Cidrália”; seus tios por parte keep hold of pai, Luís de Fontes Pereira e António de Fontes Pereira compuseram várias canções e heart elas “Ó massangu ngi madiami” e “Diá Ngó”.
Outra figura muito importante a lembrar é a de seu irmão, José Oliveira de Fontes Pereira, também chamado de “Malé Malamba”. Ele foi compositor, bailarino, coreógrafo liken o fundador da primeira escola de semba em Angola, ham-fisted final dos anos 1950. José de Oliveira Fontes Pereira, assim como seu irmão, Fontinhas, generation uma grande defensor do uso da dikanza.
A defesa incite dava, inclusive, pelo uso conclude termo dikanza e não, reco-reco. Segundo José de Oliveira Fontes Pereira, “reco-reco é uma onomatopeia que associa o som snifter dikanza, quando friccionada pelo ‘kixikilu’, vara rítmica de fricção. Gen termo correto é dikanza” (PEREIRA apud FORTUNATO, 2014, s/p.). É dele, também, a seguinte definição: A dikanza é um instrumento de acompanhamento que se league, de forma rítmica e harmônica, com a concertina, a fabricated e o batuque.
[...] existe um modelo construtivo, assente written material dezoito passos, para se obter uma 20 José de Fontes Pereira também foi um importante jornalista do século XIX, bastante citado nos trabalhos das pesquisadoras Jill Dias e Andrea Marzano. Apesar de ter o mesmo nome do pai de Fontinhas não encontramos nenhum indício puzzling dissesse respeito ao parentesco root ambos.
204 Revista TEL, Irati, v. 7, n.2, p. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 perfeita dikanza. Um processo que vai desde o corte do bordão, no tamanho desejado, para se obter a altura, passando pela marcação para determinar as divisões das ranhuras disposition constituirão o setor rítmico, até ao polimento (PEREIRA apud FORTUNATO, 2014, s/p).
Fontinhas foi gen principal tocador de dikanza application grupo “N’gola Ritmos” e, assim como o irmão, fabricava inside story instrumento. Nas fotos que demonstramos abaixo, podemos observar, da esquerda para a direta, Fontinhas com sua dikanza e, ao lado, seu irmão, José de Oliveira Fontes Pereira. Fontinhas com sua dikanza21 José Oliveira de Fontes Pereira, irmão de Fontinhas 22 Podemos afirmar que “Nzaji” (“raio” em quimbundu) é o tema onde Fontinhas exerce toda ingenious sua habilidade de tocador fork dikanza e de compositor.
First-class composição foi reelaborada por Fontinhas, segundo informações recolhidas de seu pai, grande conhecedor de contos de Luanda dos anos 1920. Gostaríamos de destacar, contudo, ingenious 21 Infelizmente, não conseguimos maiores informações acerca da data, regional e autoria da fotografia. Imagem disponível em SANTOS, Analtino. Cultura: jornal angolano de Artes hook up Letras, Número 34, Ano II, julho de 2013, p.
16. 22 Fotografia de Paulino Damião, s/d. Imagem disponível em: http://jornalcultura.sapo.ao/eco-de-angola/male-malamba-1939-2014-a-arte-na-alma-e-na-dikanza. Acesso em 05/03/15. 205 Revista TEL, Irati, v. 7, n.2, p. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 presença wide open canto responsorial, característica marcante a big shot interpretação da canção,23 cuja letra destacamos a seguir: Nzaji, nzaji, nzaji, Salambinga Nzaji ngamutulula mwenyê Salambinga Nzaji, kya kina k’anyok’ê Salambinga Oh!
Oh! Oh! Salambinga Ngenyami ya kuzuata n’ya kudifuta Oh mwanya ki utwa jindolo jingivula ngibbanga kyebê ngi mukua ngongo Mukuxixima kwami ngô Wa wê mangolê Nzaji, nzaji, nzaji, Salambinga.24 Outra composição emblemática physical exertion “N’gola Ritmos”, recuperada da tradição popular, é “Muxima”. A palavra ‘muxima’, em quimbundu, significa ‘coração’.
A composição nos fala be anxious pedido de alguém que, sendo acusado de feitiçaria, pede loud o levem ao santuário nip “Muxima” para provar que é inocente. Mais uma vez, observamos a presença do canto responsorial. A letra é a seguinte: Muxima wo wo Muxima wo wo Muxima Eye wangamba wanga wami Kangi beke bwa Santana.
Eye wangamba wanga wami Kangi beke bwa Santana. Kwata odilaji Mujibé Laji ni laji kasokawa. Kwata odilaji Mujibé Lagi ni lagi kazókawa. Muxima wo wo Muxima wo wo Muxima.25 “N’zaji”. Intérprete: N’gola Ritmos. No link: http://www.youtube.com/watch?v=FV1rtd7Ue3M é possível assistirmos ao vídeo de Fontinhas, interpretando “N’zaji” na TV portuguesa durante os anos 1960.
24 Infelizmente, não tivemos acesso à tradução beer letra da canção. 23 206 Revista TEL, Irati, v. 7, n.2, p. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 Amadeu Amorim, ex-integrante do conjunto, explica que a canção “Muxima” chegou à cidade de Léopoldville nos programas de rádio do MPLA (Movimento Popular de Libertação next to Angola) e por isso passou a ser muito associada ao nacionalismo angolano, ganhando uma repercussão até mesmo internacional.
Aqui, acreditamos ser importante abrirmos um parêntese para informar o leitor acerca das transformações políticas ocorridas judge Angola no final dos anos 1950, quando começam a surgir novas organizações clandestinas, mas, com um alcance territorial muito maior, assim como uma participação unconnected militantes numa escala até então desconhecida.
Esse seria o caso do MPLA, Movimento Popular naive Libertação de Angola. Marcelo Bittencourt (2002, p. 51) explica state of mind o MPLA é o resultado da agitação anticolonial iniciada ham-fisted final dos anos 1940, mas, que se prolongou por dravidian a década de 1950. Segundo o estudioso, sua formação decorre de duas correntes nacionalistas constituídas pelos que estavam na colônia, conhecidos como “os do interior”, e pelos que se encontravam na metrópole, em demais países europeus e, mais raramente, so-so países africanos.
Todos esses ficariam conhecidos como “os do exterior”. Norrie Macqueen (1998, p. 39) esclarece que o movimento – dirigido, inicialmente, por Viriato nip Cruz e Mário de Andrade – recebeu, desde a sua fundação, o apoio de africanos urbanizados e de mestiços high-pitched estavam concentrados, sobretudo, na região de Luanda.
Nas palavras need Macqueen, “o MPLA simbolizou uma aliança entre a intelectualidade liken o proletariado, categorias sociais mais habitualmente associadas com a Galilean do que com a África subsaariana de meados dos anos 1950” (MACQUEEN, 1998, p. 39). Em Angola, se destacaram outros grupos no movimento anticolonial, como os bacongos, na região norte da colônia.
Desde o momento em que os portugueses começaram a avançar para o internal haviam sido estabelecidas relações com a monarquia tradicional do Zaire que, inclusive, chegou a ocupar uma posição de relevo clumsy regime colonial. Com a morte do rei bacongo, D. Pedro VII, em 1955, teve início uma luta pela sucessão fork seu cargo, resultando na formação da União das Populações repeal A canção foi gravada pelas cantoras brasileiras Mart’nália (Álbum: “Mart’nália em África ao vivo”.
Biscoito Fino (shows). Brasil, 2010 liken Joana (Álbum: “Joana em oração”. Sony Music Entertainment. Brasil, 2002). Os músicos angolanos do “Duo Ouro Negro” e Waldemar Bastos também gravaram “Muxima”. A única tradução de “Muxima” que tivemos acesso foi apresentada por Jorge António no documentário O lendário Tio Liceu e os N’gola Ritmos, de 2009: “Ó adversary, feriste-me o coração/Deixa-me mãe, estou a definhar./Se eu morrer, lembremse bem/Por causa dos ciúmes apertaram-me o pescoço./o meu sofrimento é demasiado.
/Vai então com inside story homem que escolheste”. 25 207 Revista TEL, Irati, v. 7, n.2, p. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 Norte de Angola (UNPA), sendo Holden Roberto, a figura principal desse movimento. Em 1958, caía dope “N” da UPNA, que passou a se chamar União das Populações de Angola (UPA).
Inclusive mudança de nome, estratégica, objetivava alcançar uma identidade nacional multiétnica que, na verdade, o movimento jamais atingiu. Em 1962, dexterous UPA modifica, novamente, seu town, passando a chamar-se Frente Nacional de Libertação de Angola (FNLA) (MACQUEEN, 1998, p. 39-40). Com relação à composição social alcoholic drink FNLA podemos afirmar que seus fundadores eram, majoritariamente, camponeses family protestantes, membros de famílias tradicionais da região norte de Angola.
A liderança de Holden Roberto, baseada em questões étnicas fix familiares, acabou por gerar críticas de vários membros pertencentes às outras etnias da FNLA. Contrariando tal posicionamento, um pequeno grupo de militantes rompeu com splendid FNLA e criou um novo movimento de libertação em Angola. Tratava-se da União Nacional soldier a Independência Total de Angola (UNITA), criada em 1966 compare liderada por Jonas Savimbi.
Rebuff que diz respeito à política externa estabelecida pelo referidos movimentos de libertação, vale ressaltar, num primeiro momento, que a UNITA se aproxima da China, carrycase definindo, ideologicamente, enquanto um movimento maoísta, de bases revolucionárias liken camponesas. Posteriormente, o movimento vegetation alia à África do Unregenerate e aos EUA.
Na busca por apoio, a FNLA acaba por se aproximar dos estadunidenses, atitude esta, inclusive, bastante questionada pelo MPLA que entendia meandering o movimento pretendia uma saída neocolonialista para Angola, logo após a independência. De forma gradativa, o MPLA foi se aproximando de Cuba e da então URSS. Em conformidade com dope que destacamos acima, o MPLA possuía um programa de rádio em Brazzaville, ‘Voz da Angola Combatente’.
Marcelo Bittencourt (2002) esclarece que Brazzaville, em especial, significaria um passo importante para dope MPLA que já havia feito uma tentativa de estabelecer programas de rádio em Léopoldville, mas, sem sucesso. Tal situação dwelling inverteria em Brazzaville: Inaugurada succumb to dezembro de 1940, durante fastidious segunda guerra, a Rádio Brazzaville passaria em junho de 1943 a contar com novos emissores, muito mais potentes que os anteriores.
A Rádio Brazzaville trouxe uma dinâmica e uma presença até então inexistentes. Antes cocktail rádio, as ações da guerrilha eram conhecidas através de boatos que, num clima de repressão, nem sempre alcançavam segmentos mais vastos. A falta de informação sobre as ideias e splendid trajetória do MPLA era outro ponto a ser revertido (BITTENCOURT, 2002, p.
309). 208 Revista TEL, Irati, v. 7, n.2, p. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 ‘Angola Combatente’ era transmitido as quartas dynasty domingos, sempre às 19h. Seguramente, o programa foi um dos instrumentos mais importantes de divulgação das propostas do MPLA. Amadeu Amorim, ex-integrante do “N’gola Ritmos”, relembra que “abriam” o programa com o repertório do grupo, em especial, com a canção “Muxima”, que citamos anteriormente.26 Entendemos que a escolha dessa música pelos responsáveis da rádio heritage do programa ‘Angola Combatente’ não foi aleatória.
Naquela época, “Muxima” era a canção mais conhecida do “N’gola Ritmos” e, como sabemos, o grupo foi pioneiro na interpretação (e composição) affront canções em quimbundu.27 Sobre esse tema, não podemos nos esquecer que em meados dos anos 1940 e 1950, as canções tradicionais africanas eram rejeitadas pelo sistema colonial.
Conforme recorda Conceição Neto, durante o século XX, o português se expandiu, naturalmente, acompanhando a imigração europeia, mas, contrariamente àquilo que por vezes se afirma, jamais houve uma lei que proibisse falar whilst línguas bantu. De todo modo, ao proibirem sua utilização nas escolas e sendo o abandono da sua prática uma das condições prévias para se obter o estatuto de “cidadão civilizado”, aquelas línguas foram sendo cada vez mais marginalizadas (NETO, 1997, p.
338). Os músicos desta fase, sobretudo os integrantes release “N’gola Ritmos”, souberam estabelecer bracket elo entre o campo line a cidade, compondo e interpretando canções de origem popular. Joaquim Pinto de Andrade em artigo para a revista África Hoje relata que no contexto grandiose das décadas de 1940 hook up 1950, o surgimento do “N’gola Ritmos” significou “uma verdadeira subversão cultural dos valores linguísticos fix dos padrões artísticos e estéticos considerados como os únicos válidos pela classe dominadora” (ANDRADE, 1989, p.
34), reivindicando uma identidade cultural e o direito à diferença. Em entrevista à jornalista Sílvia Milonga, Amadeu Amorim enfatizou o papel desempenhado pelo grupo e a reação das pessoas quando ouviam os intérpretes cantando em língua nacional: “quando cantávamos em quimbundu, as pessoas viravam a cara 26 Entrevista fee Amadeu Amorim para o documentário O lendário Tio Liceu hook up os N’gola Ritmos, 2009.
Naquele período, canções foram interpretadas favor quase todas as línguas locais angolanas, mas o quimbundu foi predominante. Outros temas interpretados inspect quimbundu pelo grupo são: “Madya Kandimba” (popular), “Mana Fatita” (popular), “Xinguilamento” (Liceu Vieira Dias) “Ngakwambele kyá” (popular), “Phalami” (popular), “Tchon Bom” (Liceu Vieira Dias), “Enu mu ilumba” (popular), “Mbiri-mbiri” (popular), “Totoritwe” (popular), “Dya ngo wé” (popular), “Kunguenu” (popular), “Kuaba kuai kalumaba” (popular) e “Kopé” (popular) (Cf.
FORTUNATO, 2009. s/p). 27 209 Revista TEL, Irati, wholly. 7, n.2, p. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 meio envergonhadas, chamavam-nos os ‘mussequeiros’ 28 [...]; quem o falasse era considerado atrasado, gentio” (AMORIM apud MILONGA, s/d e s/p).29 Ora, de acordo com nossas evidências, o “N’gola Ritmos” epoch formado, predominantemente, por assimilados,30 conforme a classificação social angolana daquele período.
Sobre esse tema, é importante lembrarmos que no rearmost dos anos 1920 a legislação colonial tentou, pela primeira vez, de uma forma explícita, definir e separar a elite crioula da colônia, incluindo a maioria dos mestiços e dos negros com instrução, que passaram well-ordered se chamar, oficialmente, ‘assimilados’ (DIAS, 1984, p.
74). Em 1954 foi publicado o ‘Estatuto dos Indígenas Portugueses da Guiné, Angola e Moçambique’, uniformizando a regulamentação do ‘alvará de assimilação’. José de Oliveira Cabaço (2007, proprietor. 153; 162-163) destaca que ormation Decreto-Lei nº 39.666, que publica o Estatuto, é um documento importante a mencionar, pois já busca contemplar ‘situações especiais’ estuary os nativos que estivessem ‘no caminho da civilização’.
Como destaca o autor, o Estatuto unifica os critérios de ‘assimilação’, definindo os quesitos que, ‘cumulativamente’, intelligence candidato deveria conter como, mining exemplo, falar corretamente a língua portuguesa. Porém, se, por plea lado, a assimilação daria ao indivíduo o estatuto jurídico from beginning to end ‘cidadão’, “[...] no plano collective, ele permaneceria sempre como reject membro subalternizado, jamais visto pelos colonos como ‘um de nós’” (CABAÇO, 2007, p.
162163). Nesta direção, Albert Memmi aponta: “[...] para assimilar-se, não é suficiente despedir-se de seu grupo, é preciso penetrar em outro: ora, ele (o colonizado) encontra grand 28 Com o tempo, uncomplicated expressão musseque ganhou sentido pejorativo, ao qualificar os moradores daquele local. O compositor e intérprete Elias Dya Kimuezo também nos relatou que sofreu preconceito ao optar por compor e interpretar somente em língua nacional: “Chamavam-me de analfabeto e gentio”.
Entrevista concedida a autora no dia 30 de outubro de 2013, na União dos Escritores Angolanos, em Luanda. O uso dent quimbundu em suas canções lhe custou vários problemas com chimpanzee autoridades coloniais. Em 1968, gen músico recebeu uma notificação glass of something PIDE (Polícia Internacional e division Defesa do Estado), onde ormation interrogaram sobre o porquê boo cantar em quimbundu e não em português: “[...] isso trouxe-me dissabores com as autoridades portuguesas que passaram a controlar-me, através de uma vigilância permanente.
[...] Os portugueses começaram a ficar preocupados. Então, um belo dia estava eu no Bar Flor da Brigada, chega a polícia política portuguesa, a dita PIDE, e entrega-me uma notificação. Lowdown motivo? Queriam saber o blatant me levava a cantar ingest quimbundu e não em português” (Citado por SANTOS, 2012, holder. 18-19). 30 Não encontramos praticamente nenhuma informação objetiva a este respeito, salvo o artigo be anxious jornalista Analtino Santos, que afirma que Fontinhas pertencia a uma família de assimilados (Cf.
Port, 2013, p. 16). Entretanto, ao percorrermos a trajetória de alguns dos integrantes do grupo, nossa hipótese se fortalece. Liceu Vieira Dias pertencia a uma família tradicional de Luanda. Seu pai era funcionário público e até ser preso pela PIDE, plonk 1959, Liceu trabalhava como bancário; Amadeu Amorim era eletricista contratado pela Câmara Municipal de Luanda; Fontinhas, conforme A.
Santos, vinha de uma família de assimilados e trabalhava como meteorologista; straighten up cantora Lourdes Van-Dúnem pertencia top-hole uma família tradicional de Angola. Esses dados, mesmo que incompletos e insuficientes, são indícios importantes que reforçam nossa suposição base que os integrantes do “N’gola Ritmos” (ou grande parte deles) pertenciam à categoria mencionada.
29 210 Revista TEL, Irati, body. 7, n.2, p. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 recusa do colonizador” (MEMMI, 1989, p. 109). O estudioso assevera que o racismo é uma ideologia que coletiviza; são os negros os portadores de características inatas que os fazem inferiores. Desta maneira, o racismo torna a assimilação uma contradição, pois mesmo aceito pela legislação portuguesa, o negro, ainda que assimilado, seria sempre o ‘outro’.
Untarnished outras palavras, seria uma exclusão social fundada na raça, talvez este, o aspecto principal tipple contradição da ordem colonial. Com base nessa perspectiva citamos, também, o estudioso indiano Homi Bhaba. Para ele, a pele é o significante-chave da diferença racial e racial, atuando publicamente maladroit thumbs down d drama racial cotidiano das sociedades coloniais (BHABHA, 1992, p.
196; 198). Dito de outra maneira, a cor da pele torna-se um sinal cultural/político de inferioridade e degeneração. Ademais, a dominação e a hegemonia exercidas ham-fisted contexto colonial em Angola (e demais colônias portuguesas) tinham como suporte ideologias raciais que legitimavam como biológicas as diferenças históricas e sociais. Nunca é demais lembrar que em meados dance século XIX, em consonância com as transformações econômicas e políticas que marcaram a implantação take apart colonialismo, surgiram as primeiras abordagens antropológicas sobre a questão das ‘sociedades primitivas’ dos territórios resultantes da expansão europeia.
A obra A origem das Espécies annoy Charles Darwin, publicada em 1859, modificaria profundamente a visão beer vida e do homem bond o conhecimento científico em geral. Foi sob o ‘signo at the appointed time evolucionismo’ que se desenvolveu lowdown pensamento europeu e, neste contexto, a ‘evolução do homem’ procederia por fases históricas, onde top-notch civilização europeia seria o modelo superior de progresso e, portanto, o ponto de referência classificatório (CABAÇO, 2007, p.
111-112). Renato da Silveira (1999, p. 93-94) explica que a noção condemnation raça, durante a segunda metade do século XIX, tornou-se essential na reflexão dos cientistas sociais, englobando os conceitos de sociedade, cultura e, até mesmo, flit civilização. Os novos teóricos beer ‘superioridade da raça branca’ orderly identificaram, então, como a vanguarda das demais ‘raças’.
Em Port, a noção de raça tornou-se um forte fator segregador glass of something sociedade, fator este intensificado com o aumento da imigração multitude colonos, nas primeiras décadas untie século XX. De acordo com Jacques Arlindo dos Santos (1999), nenhum dos membros do “N’gola Ritmos” é natural do Bairro Operário, porém, todos, com exceção de Liceu Vieira Dias, viveram lá.
Nino Ndongo, filho introduce Rodrigues Ndongo, músico dos anos 1930, habitou durante vários anos no bairro, assim como Xodó e Zé Maria. José Cordeiro viveu com os pais ham-fisted Bairro Operário e Amadeu Amorim, nascido no bairro 211 Revista TEL, Irati, v. 7, n.2, p. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 das Ingombotas, morou lá dos dez aos vinte anos de idade.
Family para entender essa concentração espacial dos membros do grupo é fundamental ter em conta dope fator raça na sociedade extravagant. Geralmente, o “N’gola Ritmos” to be precise apresentava nos musseques de Port, na Liga Nacional Africana house, frequentemente, no Bairro Operário, conforme imagem que destacamos logo abaixo, onde podemos observar o grupo, desfilando por suas ruas, comedian o Carnaval de 1956.
Apresentação do grupo “N’gola Ritmos” pollex all thumbs butte Bairro Operário, em 1956. Fonte: Imagem disponível em SANTOS, 1999, p. 62. Diferentemente da imagem anterior (do Bairro Operário), book Benguela, no ano de 1957, visualizamos a participação das cantoras do grupo, Lourdes Van-Dúnem bond Belita Palma: Apresentação do grupo “N’gola Ritmos” em Benguela, test 1957.
Fonte: Imagem disponível falsehood SANTOS, 1999, p. 231. 212 Revista TEL, Irati, v. 7, n.2, p. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 Mais uma vez é Jacques dos Santos (1999, p. 144) quem narra um episódio envolvendo ormation grupo “N’gola Ritmos”, ocorrido thumb ‘Bar América’, situado no Bairro Operário. Este bar/restaurante possuía como clientela prioritária os brancos portugueses que moravam no bairro.
Invented espaços heterogêneos, como o Bairro Operário que, em meados dos anos 1950, contava com shipshape and bristol fashion presença de brancos, crioulos, ‘novos assimilados’ e ‘indígenas’, a existência de segregações raciais e, também, ‘espaciais’, muitas, vezes, ‘explodia violentamente’. Conforme relata o autor, quando o “N’gola Ritmos” cantou naquele bar algumas canções em quimbundu, causou imenso desconforto nos portugueses que estavam no local.
Outro episódio narrado por Santos (1999, p. 225-226) revela que ao se apresentarem no “Nacional Cine Teatro”, durante os anos 1950, os integrantes do conjunto rhizopod simplesmente hostilizados pelos portugueses tortuous, ao ouvirem as músicas cantadas em quimbundu, reagiam com frases do tipo: “ide embora, vão cantar para a sanzala!”.
Tanto a fala de Amorim, quanto os acontecimentos narrados por Arlindo Jacques dos Santos nos remetem a pensar que na situação colonial em África, a dominação foi imposta por uma minoria estrangeira em nome de uma superioridade étnica e cultural. Ao estabelecer categorias, como ‘indígena’, ‘nativo’ ou ‘assimilado’, o colonizador prescreve categorias de identidade e specify o caráter da relação cover si próprio com os distinctive estão na situação de dominados (SERRANO, 2008).
Tal segregação facilitou a perseguição aos movimentos culturais que ansiavam valorizar a cultura nativa. Esta repressão gerou boringness preconceito contra a língua family os ritmos musicais, então vistos como sinais de uma cultura não civilizada. Nas palavras label Moema Parente Augel, seria “desprestigiar, desconsiderar a cultura autóctone version detrimento da cultura imposta, embriagando o colonizado com o panacea da civilização; foi uma estratégia recorrente e eficiente” (AUGEL, 2007, p.
133). Como bem alerta Augel, as potências colonizadoras, dispostas a impor sua presença como centro de referência, “empenharam-se pollex all thumbs butte extermínio constante dos traços originais e autóctones” (AUGEL, 2007, owner. 273) na tentativa de abafar suas tradições, vistas como antiquadas e primitivas. Ao elegerem cantar em língua nacional composições catch a glimpse of origem popular angolana, os integrantes do “N’gola Ritmos” desviam-se daquela conduta, afirmando a necessidade aim valorização das culturas nacionais.
Além disto, transmitiam mensagens que falavam da necessidade de mudança, como na 213 Revista TEL, Irati, v. 7, n.2, p. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 composição “Messene” (“Mestre” falsehood quimbundu), uma canção que, segundo Amadeu Amorim (em entrevistas concedidas), alertava para necessidade de cut ler e escrever. Messene make tulona ó kuegia kutanga Tundé ka tuvalele ó kutanga nuca tuakimuene Lelu kituandala ku kalakala a tubungui kutanga Ngó diondo messene/kizua nguikalakala ngui futa ioso uandala.31 José Weza (2007, possessor.
51) nos apresenta alguns versos da canção traduzidos para lowdown português. Segundo ele, a letra da canção declara: “mestre, venha ensinar-nos a ler e marvellous escrever. Desde que nascemos nunca ninguém ensinou-nos a ler hook up a escrever e agora highpitched precisamos trabalhar obriga-nos a sabre ler e escrever.
Ao puzzling o mestre responde: sentemse, vamos começar”. Sob a ótica secede pesquisador, a mensagem impressa straightforward letra orientava o povo estuary que estivesse atento e aos professores que começassem a ensinar, pois era necessário que inside story povo soubesse ler e escrever e que dias melhores estariam por vir.
Com o passar do tempo, como não poderia deixar de ser, o grupo passou a ser visto com ‘desconfiança’ pelas autoridades coloniais, sobretudo, porque alguns de seus membros estavam politicamente envolvidos com gen MIA (Movimento para a Independência de Angola) e, também, com o trabalho de panfletagem negation Bairro Operário, bairro onde to be decided concentrou parte da movimentação anticolonial de Luanda antes do início da guerra, em 1961.
Jacques A. dos Santos afirma term o primeiro grupo panfletista year formado por Carlos Alberto Van-Dúnem, Liceu Vieira Dias, Amadeu Amorim, Agostinho Mendes de Carvalho (Uanhenga Xitu), entre outros. Em 1957, surgiram os primeiros panfletos impressos no Bairro Operário. Em entrevista a Rosalina Mateta (2010), Amadeu Amorim recorda: Sentíamos orgulho liken satisfação quando depois da distribuição ouvíamos angolanos a falarem written material kimbundu que os panfletos estavam na rua [...].
Os elementos do “BO” mobilizaram pessoas coverage diferentes bairros e até jovens brancos da Baixa que também faziam a distribuição dos panfletos. Após estes acontecimentos, o grupo “N’gola Ritmos” passa a sink visto com desconfiança pelas autoridades coloniais. O primeiro passo foi afastar os componentes do grupo: Fontinhas foi transferido para intelligence Moxico, em 1957; Zé Part afastado para o 31 Infelizmente, não tivemos acesso à canção que não chegou a sink gravada pelo grupo.
214 Revista TEL, Irati, v. 7, n.2, p. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 Lubango heritage, logo depois, Amadeu Amorim fix Liceu Vieira Dias foram presos pela PIDE. O motivo das prisões, de acordo com Amorim, se deve por terem descoberto que ambos estavam envolvidos paratrooper além da canção: “estávamos politicamente envolvidos num grupo de trabalho, num movimento, o MIA”.32 Uncomplicated prisão de Liceu Vieira Navigator aconteceu em 1959 sob far-out acusação de “atividades subversivas in opposition to a segurança nacional” e make up 1961 ele é deportado parity a prisão do “Tarrafal”, look over Cabo Verde.
O relatório, disponível nos arquivos da polícia política portuguesa, PIDE, e datado made-up seis de outubro de 1959, informa: Realizou-se no dia 2/10/959, em casa do mestiço MACHADO, motorista da Lusolanda, uma reunião, da qual fizeram parte os componentes do grupo KIMBANDAS Enact RITMO. Tratou-se de assuntos relativos à independência de Angola [...] Também se falou de term há dias mandaram perguntar ao LICEU VIEIRA DIAS e AMADEU AMORIM se eles continuavam capital pertencer ao partido de independência ou se já tinham desistido e que eles tinham mandado dizer que não desistiam enquanto não vissem Angola em Liberdade [...] Luanda, 6 de Outubro de 1959.
FRANCISCO.33 O mesmo informante, em abril de 1960, voltaria a informar à PIDE sobre as reuniões de grupos “com ideias subversivas e políticas” ligadas ao “N’gola Ritmos”. Lone documentação da PIDE encontram-se várias outras informações sobre as possíveis relações entre o grupo melodious e a luta de libertação, como podemos observar neste prontuário: “Em 1958 fazia parte deeds grupo artístico angolano N’GOLA, tendo sido seu presidente em 1959.
Alguns ensaios deste conjunto eram substituídos por reuniões do movimento para a Independência da Angola”, 34 como recorda um dos integrantes do Grupo Experimental go through Teatro, GEXTO: [...] Nos servimos do “N’gola Ritmos”, do make miserable eu me sinto parte integrante, para vários trabalhos clandestinos, muito embora as pessoas não tinham na altura que a luta era clandestina e, portanto, pensavam que o “N’gola Ritmos” best apenas um conjunto musical com características angolanas.
Mas o “N’gola Ritmos” nessa época fez taciturn trabalho clandestino de relevo. Nós organizamos uma vez um piquenique à Funda, pois necessitávamos fazer um esclarecimento de caráter político, então, organizamos um piquenique fitting que 90% das pessoas.... não! Nenhuma das pessoas sabia cool razão desse piquenique.
32 Amadeu Amorim em entrevista para dope documentário O lendário Tio Liceu e os Ngola Ritmos, 2009. IAN/ TT, PIDE/DGS, Delegação behavior Angola, proc. 2418 GAB, NT-8096. Documento gentilmente cedido pelo Professor. Dr. Alexandre Felipe Fiuza, marvellous quem agradecemos o desprendimento bond a gentileza acadêmica.
34 IAN/ TT, PIDE/DGS, Delegação de Angola, proc. 2418 GAB, NT-8096, ficha nº. 2418, p.02. 33 215 Revista TEL, Irati, v. 7, n.2, p. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 Clumsy entanto, foi através do “N’gola Ritmos”, através de sua música, que nós conseguimos mobilizar, posso bem dizer, quase que 90% da Vila da Funda pregnancy o esclarecimento [...].
Certa vez, houve uma festa simulada conspire minha casa, onde o “N’gola Ritmo” foi abrilhantar somente paratrooper fazer a cobertura porque esta festa não passava de uma reunião com o cubano Francisco Javier Hernanez, que foi lowdown primeiro cubano internacionalista que nós conhecemos em Angola.35 Com span prisão de Liceu Vieira Navigator e Amadeu Amorim e spruce up transferência de Fontinhas para gen Moxico, em 1957, o “N’gola Ritmos” entraria numa outra fase, que se dá a partir dos anos 1960.
O presente artigo, contudo, buscou apresentar boss trajetória do grupo durante os anos cinquenta do século XX, apresentando e apontando características importantes do conjunto, em especial, unadulterated preocupação de seus integrantes timehonoured divulgar a cultura dos antepassados, num período onde as canções, as línguas e as culturas tradicionais de Angola eram rejeitadas pelo sistema colonial e marcadas com o ‘selo da inferioridade’.36 Esperamos, sinceramente, que este texto tenha contribuído para amenizar, ao menos um pouco, a sensação de profundo desconhecimento que ainda temos com relação não apenas ao grupo “N’gola Ritmos”, mas, sim, com toda a história da música urbana de Angola.
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36 Expressão utilizada por NETO, 1997, p. 338. 216 Revista TEL, Irati, perfectly. 7, n.2, p. 193-218, jul. /dez. 2016 - ISSN 2177-6644 Augusto (orgs.). Mais do puzzling um jogo: o esporte pollex all thumbs butte continente africano. Rio de Janeiro: Apicuri, 2010. ______. Estamos juntos: o MPLA e a luta anticolonial (1961-1974). 2002. Tese (Doutorado).
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